sábado, 30 de outubro de 2010

Bastidores de uma foto comovente


Na sexta-feira, 29 de outubro, quando o fotógrafo Ricardo Stuckert entrou no quarto do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, o presidente Lula já estava conversando com seu vice, José Alencar, internado para mais uma sessão de quimioterapia. “Meu helicóptero chegou dez minutos depois”, explicou Stuckert ao blog. No quarto também estavam Marisa, mulher do vice-presidente, e o médico Roberto Kalil.

Lula e Alencar conversavam sobre a festa de aniversário do presidente, realizada na quarta-feira, em Brasília. Na ocasião, foi exibido um DVD com depoimentos de um neto de Lula, de sua mulher, Marisa Letícia, e do vice, que emocionaram o presidente. Alencar, desanimado, lamentou não ter participado da festa, por ter reiniciado, mais uma vez, o tratamento contra o câncer.

Foi quando Lula disse: “Zé, nós subimos a rampa (do Palácio do Planalto) juntos, nós vamos descer juntos”. Alencar se emocionou, levando o presidente a fazer o gesto captado pela lente do fotógrafo.

Stuckert acompanha Lula como fotógrafo da Presidência desde o primeiro dia de governo e vai deixar o Planalto no dia 1º de janeiro de 2011.

Do blog de Maurício Stycer
FOTO: Ricardo Stuckert

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Resposta a Noblat


Se fosse uns anos atrás, Noblat teria saído impune de suas ácidas críticas feitas em seu blog. Não que não as possa fazer... mas sequer poderia ser contraposto, já que o poder de dizer o discurso era restrito a uns poucos. Agora, felizmente, não é mais assim. E gente como Carlos Torres Moura, da pequena cidade mineira de Além Paraíba, pode externar o que pensa, com a mais ampla divulgação na internet. Mesmo a contragosto do Noblat e sua turma.
Em tempo: no blog, Ricardo Noblat diz que a Lula falta “caráter, nobreza de ânimo, sentimento, generosidade”.



Noblat

Quem é você para decidir pelo Brasil (e pela História) quem é grande ou quem deixa de ser? Quem lhe deu a procuração? O Globo? A Veja? O Estadão? A Folha?

Apresento-me: sou um brasileiro. Não sou do PT, nunca fui. Isso ajuda, porque do contrário você me desclassificaria, jogando-me na lata de lixo como uma bolinha de papel. Sou de sua geração. Nossa diferença é que minha educação formal foi pífia, a sua acadêmica. Não pude sequer estudar num dos melhores colégios secundários que o Brasil tinha na época (o Colégio de Cataguases, MG, onde eu morava) porque era só para ricos. Nas cidades pequenas, no início dos sessenta, sequer existiam colégios públicos. Frequentar uma universidade, como a Católica de Pernambuco em que você se formou, nem utopia era, era um delírio.

Informo só para deixar claro que entre nós existe uma pedra no meio do caminho. Minha origem é tipicamente “brasileira”, da gente cabralina que nasceu falando empedrado. A sua não. Isto não nos torna piores ou melhores do que ninguém, só nos faz diferentes. A mesma diferença que tem Luis Inácio em relação ao patriciado de anel, abotoadura & mestrado. Patronato que tomou conta da loja desde a época imperial.

O que você e uma vasta geração de serviçais jornalísticos passaram oito anos sem sequer tentar entender é que Lula não pertence à ortodoxia política. Foi o mesmo erro que a esquerda cometeu quando ele apareceu como líder sindical. Vamos dizer que esta equipe furiosa, sustentada por quatro famílias que formam o oligopólio da informação no eixo Rio-S.Paulo – uma delas, a do Globo, controlando também a maior rede de TV do país – não esteja movida pelo rancor. Coisa natural quando um feudo começa a dividir com o resto da nação as malas repletas de cédulas alopradas que a União lhe entrega em forma de publicidade. Daí a ira natural, pois aqui em Minas se diz que homem só briga por duas coisas: barra de saia ou barra de ouro.

O que me espanta é que, movidos pela repulsa, tenham deixado de perceber que o brasileiro não é dançarino de valsa, é passista de samba. O patuá que vocês querem enfiar em Lula é o do negrinho do pastoreio, obrigado a abaixar a cabeça quando ameaçado pelo relho. O sotaque que vocês gostam é o nhém-nhém-nhém grã-fino de FHC, o da simulação, da dissimulação, da bata paramentada por láureas universitárias. Não importa se o conteúdo é grosseiro, inoportuno ou hipócrita (“esqueçam o que eu escrevi”, “ tenho um pé na senzala” “o resultado foi um trabalho de Deus”). O que vale é a forma, o estilo envernizado.

As pessoas com quem converso não falam assim – falam como Lula. Elas também xingam quando são injustiçadas. Elas gritam quando não são ouvidas, esperneiam quando querem lhe tapar a boca. A uma imprensa desacostumada ao direito de resposta e viciada em montar manchetes falsas e armações ilimitadas (seu jornal chegou ao ponto de, há poucos dias, “manchetar” a “queda” de Dilma nas pesquisas, quando ela saiu do primeiro turno com 47% e já entrou no segundo com 53 ) ficou impossível falar com candura. Ao operário no poder vocês exigem a “liturgia” do cargo. Ao togado basta o cinismo.

Se houve erro nas falas de Lula isto não o faz menor, como você disse, imitando o Aécio. Gritos apaixonados durante uma disputa sórdida não diminuem a importância histórica de um governo que fez a maior revolução social de nossa História. E ainda querem que, no final de mandato, o presidente aguente calado a campanha eleitoral mais baixa, desqualificada e mesquinha desde que Collor levou a ex-mulher de Lula à TV.

Sordidez que foi iniciada por um vendaval apócrifo de ultrajes contra Dilma na internet, seguida das subterrâneas ações de Índio da Costa junto a igrejas e da covarde declaração de Monica Serra sobre a “matança de criancinhas”, enfiando o manto de Herodes em Dilma. Esse cambapé de uma candidata a primeira dama – que teve o desplante de viajar ao seu país paramentada de beata de procissão, carregando uma réplica da padroeira só para explorar o drama dos mineiros chilenos no horário eleitoral – passou em branco nos editoriais. Ela é “acadêmica”.

A esta senhora e ao seu marido você deveria também exigir “caráter, nobreza de ânimo, sentimento, generosidade”.

Você não vai “decidir” que Lula ficou menor, não. A História não está sendo mais escrita só por essa súcia de jornais e televisões à qual você pertence. Há centenas de pessoas que, de graça, sem soldos de marinhos, mesquitas, frias ou civitas, estão mostrando ao país o outro lado, a face oculta da lua. Se não houvesse a democracia da internet vocês continuariam ladrando sozinhos nas terras brasileiras, segurando nas rédeas o medo e o silêncio dos carneiros.

Carlos Torres Moura
Além Paraíba-MG

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Mídia ao Avesso (coluna no Jornal Agora)

Avisem a Folha SP: dessa vez o senador Romeu Tuma faleceu de verdade.

Quem assistiu ao debate de segunda-feira, na Record, pode ter ficado com a mesma impressão: a campanha praticamente acabou. Durante praticamente todo o tempo, ambos os candidatos foram fracos, sem retórica, inseguros, chatos e repetitivos. É quase como uma partida de pôquer onde já fizeram todas as apostas, e agora só aguardam que as cartas sejam abertas pra ver o que vai dar.


Dois analistas, contratados pelo Estadão para acompanhar o debate, sugeriram que Dilma teria ido melhor, enquanto Serra "não convenceu" em seu novo discurso, totalmente dissociado da ideologia do PSDB. Como não tenho as credenciais de "analista", me permito discordar do alto de minha ignorância. Na minha opinião, do último debate da Record não se extrai sequer o "menos pior".


Dilma, como que se desculpando pelo discurso enfadonho, já antecipava: "quero insistir", "vou continuar", "quero voltar ao tema"... E então, dê-lhe privatização. Nervosa ou cansada, a petista gaguejou diversas vezes, e não deu resposta a repetidas acusações de que seria responsável por supostos desmandos no setor elétrico.


Serra querendo colar no PT a pecha de privatista deve ter soado ridículo principalmente para os próprios seguidores da cartilha social democrata de verniz tucanista. Embora, no fundo, tenha ficado claro que o tucano não propriamente "atacava" uma suposta privatização feita pela Petrobras antes da confirmação do pré-sal. Pareceu mais uma "defesa antecipada" do que faria, se eleito fosse. Algo como "se até vocês [petistas] fizeram, por que eu não faria, se eleito?"


Que venha o domingo de uma vez.


Por aqui, o PMDB parece cada vez mais "desintegrado". Enquanto boa parte do partido, no RS, pendeu para a candidatura tucana à presidência, alguns nomes da sigla preferiram a dissidência estadual, aderindo ao PMDB nacional, que apoia Dilma e Temer. Na semana passada, em visita ao Estado, Temer teve a companhia (e o apoio aberto) de Mendes Ribeiro Filho, Álvaro Boessio e o rio-grandino Sandro Boka. O racha se deu também na coligação do PMDB com o PDT. vieira da Cunha e Pompeo de Mattos (este último, companheiro de Fogaça na chapa derrotada por Tarso) também "dilmaram".


Com Serra, estão Fogaça, Rigotto e a executiva peemedebista, que declarou "posição favorável" ao tucano, mas deixando os filiados liberados para votarem em qualquer dos dois candidatos. Ao Agora, durante a visita de Serra a Rio Grande, o prefeito do Rio Grande, Fábio Branco, disse que não tinha ainda posição definida, mas adiantou que a "oposição radical" que o PT faz no município seria um "obstáculo" a eventual apoio seu à Dilma.


Alguns insistem em que não passa de "teoria da conspiração" achar que a grande imprensa optou veladamente por Serra e manipula seus noticiários a favor dele. Então, como explicar o modo como noticiaram o caso do jornalista Amaury Ribeiro Jr., omitindo a informação de que o material por ele coletado contra o candidato do PSDB tinha DNA tucano, servindo para proteger Aécio em uma disputa com Serra pela indicação do partido? E mais: como se explica que a grande mídia destine capas de jornais e revistas a denúncias de grampos sem áudio ou a acusações sem provas feitas por criminosos contumazes, mas não noticie uma linha sobre a farta documentação distribuída na segunda-feira aos colegas por Amaury, e que liga a campanha de José Serra à lavagem de dinheiro em paraísos fiscais?


Está tudo lá: números de conta, depósitos na conta Beacon Hill em valores que passam de US$ 1,4 milhão, ligação entre Serra, Gregório Marin Preciado e Ricardo sérgio (diretor do BB no governo FHC-Serra), sociedade entre Verônica Serra e Verônica Dantas... Tudo à disposição, prontinho para uma bela capa de Veja ou manchete da Folha e do Globo. Quem sabe até seja publicado, após as eleições!


Mino Carta escreveu: "A fidelidade canina à verdade factual é, a meu ver, o primeiro requisito da prática do jornalismo honesto". Quando publiquei, na semana passada, reportagem sobre o indiciamento do secretário de Trânsito, Enoc Guimarães, nada fiz senão me ater à verdade factual. E continuarei agindo assim, apesar de
eventuais ameaças, que serão tratadas na esfera devida. Em tempo: até onde sei, o secretário não tem qualquer participação nesta atitude agressiva e antidemocrática, tomada deliberadamente por terceiros.

(publicada no Jornal Agora, em 27/10/2010)

Jogo estranho


Fernando de Barros e Silva

(Da Folha SP) - Este foi um segundo turno estranho. Digo "foi" porque há a sensação de que, além de estranho, já acabou. Por exaustão. Por carência de ideias. Por excesso de chatice. Pelas falsas polêmicas...

Acabou, antes de mais nada, porque Dilma Rousseff deve ser eleita no domingo, a não ser que José Serra produza em cinco dias o milagre que não foi capaz de fazer desde que se lançou, em abril.

Tem-se, hoje, a impressão de que o tucano não encontrou o tom da campanha e esgotou suas armas. Quais foram elas? Um capacete na cabeça e um crucifixo na mão.

A insistência no tema do aborto, com o trololó religioso que durou semanas, e a valorização estridente da agressão de que foi vítima no Rio são sintomas de um candidato sem foco, desesperadamente em busca de algo em que se agarrar.

Só isso explica, também, o acesso populista do tucano austero, que promete elevar o salário mínimo a R$ 600, aumentar em 10% o valor da aposentadoria e pagar 13º para os beneficiários do Bolsa Família. Serra quis parecer o Lula do Lula.

Mobilizando a agenda conservadora ou mimetizando a pauta petista, o tucano apostou sempre e tão somente em si mesmo, na sua capacidade de fazer, mandar, decidir.

Pode soar estranho, porque se trata de um personagem doente de tão racional, mas Serra é um candidato com forte traço messiânico.

Mas o que ou quem ele quer salvar? Os pobres? A democracia? Os valores da família? A nossa fé? Apesar de ser mais aparelhado do que sua adversária, o tucano se desvirtuou no processo eleitoral, sem, no entanto, conseguir romper o encanto do lulismo nem propor uma discussão séria do país, que fosse além da sua obsessão pessoal.

Parece mais fácil (é essa a inclinação da maioria) atribuir a provável derrota tucana aos "erros" do candidato, e não às dificuldades objetivas de enfrentar a escolhida de Lula na conjuntura atual. Serra colaborou para que as pessoas cometessem essa injustiça com ele.


(publicada na Folha de SP, em 26/10/2010)

Os cães de guarda do Serra em ação

Emiliano José *

Estamos a seis dias das eleições. Não sei por que, mas logo me veio à mente o título do notável livro de John Reed – Os dez dias que abalaram o mundo. É uma notável reportagem sobre a aurora da Revolução Russa. A lembrança talvez venha porque tenho absoluta convicção de que esses próximos dez dias são fundamentais para o nosso destino, para o destino do povo brasileiro. E mais do que isso, e é disso que quero tratar, serão dias de um estrebuchar midiático nunca antes visto neste País. Nós não temos o direito de nos enganar quanto a isso. Não podemos nos iludir.

Está posto que a mídia no Brasil é uma das mais partidarizadas do mundo. Não há no Brasil, ao menos se consideramos o seleto núcleo de famílias de onde sai as diretivas para o resto do País, não há aquilo que no jornalismo se denomina cobertura, que implica um olhar sobre o fato o mais verdadeiro possível. O núcleo é constituído pelas famílias que controlam os complexos midiáticos Globo, Folha, Estadão e Abril. Esse é o secretariado do Comitê central do partido político midiático brasileiro. E está posto que a ação deles nesses 10 dias será intensa. E que não haverá qualquer compromisso com os fatos.

O candidato do partido é Serra – ou será que há ainda quem duvide? E por esse candidato eles – os barões midiáticos – continuarão a fazer mais do mesmo – utilizar os fatos para construir as versões que melhor atenderem aos interesses de Serra. Lula, antes da divulgação do relatório da Polícia Federal sobre os supostos dossiês sobre os tucanos, disse que o problema eram sempre as versões, e acertou em cheio. Deturparam tudo. Os tucanos se engalfinham e o PT é culpado.

Os barões midiáticos atuarão nesses dias com uma intensidade maior do que tudo aquilo que nós já vimos, embora o que se viu até agora em nossa história não seja pouco. Estão considerando que esta é a eleição da vida deles. A expectativa de continuarem fora do controle direto do Estado os preocupa e por isso cotidianamente a cobertura e os colunistas se empenham todo o tempo em subsidiar a oposição, em municiar o candidato do partido.

Que não me alertem sobre o perigo de uma visão conspirativa.

A mídia brasileira, ao menos aquele núcleo hegemônico, conspira há muito tempo, e sempre a favor das classes dominantes, dos setores mais conservadores da sociedade brasileiros, dos eternos detentores de privilégios. Eles não guardam sequer o recato de cumprir os manuais de redação, aquelas coisas do beabá do jornalismo, que se aprende nos primeiros semestres das escolas de comunicação. No partido político midiático, que o deputado Fernando Ferro chamou de Partido da Imprensa Golpista, o famoso PIG, a pauta tem sempre direção, orientação política, e ao reportariado cabe cumpri-la, sem discussão. Aqui e ali, alguma distração.

Vou insistir: não temos o direito da ilusão. Não esperemos nenhuma atitude séria, honesta do partido político midiático. Aliás, se voltamos ao passado, e não precisa ser tão remoto, vamos ver sempre esse partido atuando em favor das causas mais conservadoras, sem temer pelas conseqüências. Quem quiser, dê uma lida no capítulo denominado Mar de Lama, do livro de Flávio Tavares denominado O dia em que Getúlio matou Allende e outras novelas do poder. Nesse capítulo, fica evidente como a mídia orientou toda a ação política para derrubar Getúlio, e que terminou com o suicídio do presidente.

Quem não se lembra da atividade militante de nossa mídia a favor do golpe de 1964, salvo sempre as exceções, e nesse caso só Última Hora? Não importa que daí sobreviesse, como ocorreu, um regime de terror e morte. E durante a ditadura, a mídia teve sempre uma atitude complacente, como denomina o jornalista e professor Bernardo Kucinski em seu livro Jornalistas e Revolucionários – nos tempos da imprensa alternativa. Complacente e muitas vezes conivente com a ditadura.

Quem quiser conhecer um pouco da atitude do Grupo Folhas durante a ditadura é só ler o extraordinário livro de Beatriz Kushnir – Cães de Guarda – Jornalistas e Censores. Ali fica evidente como o Grupo Folhas foi um entusiasta defensor da ditadura militar. O Estadão, se sabe, foi sempre um jornal vinculado à direita. Teve o mérito, ao menos, agora, de declarar o voto em Serra. E mostrou a sua verdadeira face ao censurar Maria Rita Khel por publicar artigo defendendo o Bolsa Família. Do grupo Civita, há pouco que dizer, por desnecessário. A revista Veja é uma excrescência, um panfleto da extrema-direita. Do grupo Globo, que dizer? Há uma caudalosa bibliografia a respeito, que a desnuda, e que eu não vou perder tempo em citá-la. Era porta-voz da ditadura, esteve sempre ao lado dos privilegiados e se aliou ao longo de sua história, sem qualquer variação, aos mais destacados homens da direita brasileira.

Por tudo isso, quero reiterar: vamos manter acesa a idéia de que é preciso mostrar o que esse projeto político em curso, com Lula à frente, fez pelo povo brasileiro, as extraordinárias mudanças que estamos fazendo no Brasil. E, por todos os meios que tivermos, no leito da democracia, desmontar o festival de mentiras, de calúnias, de sordidez que vem sendo orquestrado pela campanha de Serra, com a participação decisiva do partido político midiático.

Mais do que nunca é necessário dar adeus às ilusões de uma mídia com características democráticas no Brasil atual. E é necessário ter clareza de que temos que dar passos firmes na direção da democratização da mídia, por mais que ela estrebuche. A imprensa tem que cumprir com suas obrigações constitucionais. Não pode se constituir em partido político disfarçando-se de imprensa. A democracia há de chegar à mídia também. Para que o país avance. E para que façamos isso é preciso eleger Dilma presidente.

* Jornalista, escritor, prof. Dr. em Comunicação e Cultura Contemporâneas.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Coluna Mídia ao Avesso (Jornal Agora)

Apesar das limitações inerentes a uma criação humana (afinal, todo ser humano é falho), o judiciário ainda é a derradeira esperança para aqueles que esperam por justiça no âmbito terreno (se é que existe outro "âmbito" além deste). Esta introdução, um tanto quanto óbvia, comemora duas ações ajuizadas recentemente, patrocinadas pelo eminente jurista Fábio Konder Comparato. Uma é relativa a um caso de tortura e morte durante a ditadura militar; a outra é uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) relacionada à regulamentação das empresas de comunicação no Brasil.

A ação relativa ao período da ditadura ("ditabranda", segundo a Folha de SP) é movida pelos familiares do jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino, torturado e assassinado nas dependências do DOI-CODI paulista, supostamente a mando do arrogante coronel Brilhante Ustra, considerado um dos principais carrascos da ditadura militar.

A morte de Merlino foi escondida pelos órgãos repressores que, dias depois, disseram que o jornalista teria "cometido suicídio", ao se jogar em frente a um "veículo não identificado" na BR-116, quando era levado a Porto Alegre para "reconhecimento de colegas militantes" (leia-se "delação sob tortura"). A verdade veio à tona tempos mais tarde: o jornalista fora torturado por cerca de 24 horas, na sede do DOI-CODI paulista, e abandonado numa solitária até a morte.

Na missa de sétimo dia de Merlino, a hipócrita crueldade: os mesmos agentes que arrancaram Merlino da casa de sua família para devolver-lhe apenas morto ocupavam os primeiros bancos da igreja, e deram os pêsames à mãe enlutada.

Quem lê o relato desta e outras atrocidades cometidas nos porões da ditadura - defendida, diga-se de passagem, inclusive em editorias de alguns dos principais veículos de comunicação da época - jamais poderá se colocar a favor de uma anistia que alcance torturadores e assassinos.

A outra ação, protocolada nesta terça-feira junto ao STF, trata-se de uma Adin por omissão. Grosso modo, é uma ação que visa a mostrar que dispositivos da Constituição estão sendo descumpridos em função da omissão do Congresso Nacional, ao deixar de editar as leis que regulamentariam determinado tema. No caso, questões relativas à regulamentação da imprensa. A ação pede regulamentação do direito de resposta, sem o qual a imprensa pode atacar reputações quase que impunemente. Pede ainda a regulamentação do art. 221 da CF, que trata do conteúdo das programações de emissoras de rádio e TV, respeitando "valores éticos e sociais".

Mas o pedido mais importante na ação é quanto ao que pede que o Congresso regulamente o art. 220 da CF, o qual proíbe o monopólio ou oligopólio dos meios de comunicação social. Que, atualmente, ocorre descaradamente no País, com óbvios prejuízos à formação da chamada "opinião pública", manipulada pelas diretrizes de poucas famílias detentoras de poderosos conglomerados de comunicação.

O momento atual, quando se observa a desproporcional influência exercida pela grande mídia em prol de uma das candidaturas à presidência (e, por consequência, de um determinado modelo político), é mais que propício a uma ação como esta. É fundamental.

A mídia tradicional perde força quando confrontada com novos modelos mais "horizontais" de comunicação, como ocorre hoje na internet, em blogs, fóruns de discussão, twitter etc. Ainda assim (e apesar do festival de manipulação patrocinado por alguns veículos), continua contando com parcela significativa de crédito junto à população. Me coloco como exemplo. Quando saiu a informação, no Facebook, de que uma ex-aluna da esposa de José Serra teria admitido ter feito aborto, hesitei em acreditar, e até mesmo sugeri que não disseminassem o fato, pois poderia ser uma armadilha para vitimizar o tucano. Só fui acreditar na veracidade quando vi a ex-aluna confirmar a informação a jornais tradicionais, como aos estrangeiros Página 12, Clarín, La Nacion, ou mesmo ao brasileiro Folha.

Em tempo: não entro no mérito do aborto em si. Creio que cabe muito mais às mulheres esta discussão. A questão é a hipocrisia contida nas críticas de quem, supostamente, teria praticado o mesmo ato.

O vice-presidente do Congresso Mundial Judeu, rabino Marc Schneider, disse nesta semana que acusar Israel de promover ocupação ilegal nos territórios palestinos seria "um insulto" a Israel. Pois bem, sr. rabino: então eu (e a quase totalidade da comunidade internacional) mantenho essa opinião, baseado principalmente (entre outras) nas resoluções nºs 446 e 478 da ONU. Ou seja, se este argumento é um insulto, continuarei a insultar Israel até que este Estado fascista pare de insultar os direitos humanos e o Direito Internacional.

Resolução 446 da ONU: (...) a criação de Assentamento israelita [assentamentos] por parte de Israel nos territórios árabes ocupados desde 1967 não tem validade legal e constitui um sério obstáculo para o lucro de uma paz completa...
Resolução 478 da ONU: (...) A resolução "censura nos termos mais enérgicos" a Lei de Jerusalém [aprovada por Israel, considerando Jerusalém como "cidade inteira e unificada, como capital de Israel"] e afirma que esta lei é uma violação do direito internacional e não afecta à contínua aplicabilidad em Jerusalém do Convênio de Genebra relativo à protecção de pessoas civis em tempo de guerra. Ademais, determina que a Lei de Jerusalém e todas as demais medidas e actos legislativos e administrativos adoptados por Israel, a potência ocupante, que têm alterado ou pretendam alterar o carácter e o estatuto de Jerusalém "são nulos e carentes de valor e devem deixar-se sem efeito imediatamente"...

terça-feira, 19 de outubro de 2010

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Serra mente e Terra desmente




Do portal Terra:
Bob Fernandes
Direto de São Paulo

O candidato do PSDB à presidência da República, José Serra, afirmou no debate promovido pela RedeTV!/Folha no domingo (17) à noite que o Terra não publicou uma explicação que ele teria dado em Goiânia sobre o ex-diretor do Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S/A) Paulo Vieira de Souza, também conhecido como Paulo Preto. Na verdade, o portal publicou as únicas informações a respeito dadas por José Serra naquele dia. E mais: em todos os demais portais, jornais, emissoras de rádio e TV não há nenhum registro de explicação adicional do candidato Serra além do que foi veiculado na segunda-feira (11).

Acima, disponível para os internautas, o áudio da pergunta e a resposta de Serra no debate da RedeTV! e também o áudio do que ele disse exatamente em Goiânia.

Em tempo: Paulo Preto, segundo Dilma Rousseff afirmou no debate da TV Bandeirantes no domingo (10), ao referir-se a matérias de revistas semanais, teria sumido com R$ 4 milhões arrecadados para a campanha eleitoral tucana.

Minutos após o debate na Rede TV! a repórter Marcela Rocha, do Terra, questionou o candidato sobre qual reportagem e a que dia ele se referiu no debate. Serra detalhou estar se referindo ao texto enviado na segunda-feira (11) desde "Goiânia".

Marcela Rocha não esteve em Goiânia. Mirelle Irene, correspondente do Terra em Goiás, acompanhou o candidato na segunda (11). E foi quem escreveu a reportagem aqui publicada e quem tem em mãos o áudio reproduzido acima.No único trecho em que Serra cita Paulo Preto, ou Paulo Vieira de Souza, Mirelle Irene descreve:

- Eu não sei quem é o Paulo Preto. Nunca ouvi falar. Ele foi um factoide criado para que vocês (imprensa) fiquem perguntando. Serra disse ainda que não iria gastar horas de um debate nacional discutindo "bobagens".

A respeito, uma semana depois, a repórter Mirelle Irene relata:

- Aquele foi o único momento em que o candidato Serra tocou no assunto. E o que eu, em essência reproduzi, foi o que os demais meios todos reproduziram.

O candidato fez a afirmação sobre o Terra ao responder à seguinte pergunta da jornalista Renata Lo Prete, colunista do jornal Folha de S. Paulo. "Seu partido critica o governo Lula por não saber do mensalão. Agora surge no noticiário um personagem chamado Paulo Preto. O senhor disse que não conhecia ele e depois disse que o conhecia. Hoje, foi publicado que o senhor empregou uma filha dele em seu governo. Candidato, o senhor sabia disso?".

Na resposta, o candidato alegou que o Terra não publicou reportagem onde ele teria dado outras explicações sobre o caso. Afirmou José Serra:

- Olha, a pergunta termina até sendo oportuna para esclarecer. Em primeiro lugar, o que o PT levantou na base da estratégia do pega-ladrão? O sujeito bate a carteira do outro e sai correndo dizendo pega ladrão, pega ladrão para distrair a atenção . Esse é o método. Veja só: disseram que alguém tinha recebido uma contribuição para minha campanha e não tinha entregue a contribuição. Ou seja, eu sou a vítima. O que eu disse é: eu não conheço esse problema. Nunca. Isso não aconteceu na minha campanha. Nem se trata de dinheiro de governo. É uma contribuição para uma campanha que alguém teria pego e não entregue para a campanha. Só que eu não soube disso. Nunca ninguém veio reclamar de que doou e não chegou e nem quem tá cuidando desse assunto na minha campanha fez qualquer observação nesse sentido. Disseram que o Paulo Souza. Eu não neguei que o conhecia.

Na continuação, José Serra citou o Terra, que publicou basicamente a mesma conversa que os demais meios de comunicação, como se pode ver em outros textos expostos nesta página:

- Eu fui numa segunda-feira a Goiânia e veio a repórter e perguntou: o Paulo Preto. Paulo Preto pra mim, eu não o conhecia assim. E Paulo Preto é um apelido que se dá preconceituoso e racista. Se ele fosse japonês, iam chamar de Paulo Amarelo? Será? Não. Mas como ele é descendente de africanos, puseram Paulo Preto. Paulo Preto. Essa foi a pergunta. Não foi Paulo Souza. E eu disse: Não. Não conheço. E expliquei do que é que se tratava que eu acabei de explicar aqui. Mas não foi publicado. Pode pegar o site do Terra que publicou isso e eles não publicaram a minha explicação sobre o assunto. Então eu não neguei. Não tem nada a ver.

O áudio transcrito da conversa no aeroporto de Goiânia é o seguinte:

Jornalista: Eu posso fazer uma pergunta? (confusão, vozes).

José Serra: Eu tenho que ir embora, eu tenho que ir...

Voz ao fundo (jornalista): ... do Paulo Preto...

José Serra: Isso é pauta petista. É pauta petista...

Jornalista: Mas essa questão do Paulo Preto...

José Serra: Mas eu nunca ouvi falar, eu não sei quem é o Paulo Preto. Quem é o Paulo Preto?

Jornalista: ... sobre a campanha, diz que é um dinheiro de campanha que não foi declarado...

José Serra: Nunca ouvi falar, nunca ouvi falar disso. Eles põem factoides para que vocês perguntem pra ficar rendendo. Eu nunca ouvi falar disso. Primeiro que não é fácil entender naquele programa o que ela estava dizendo. Segundo, nunca aconteceu. O que eu vou ficar dizendo? Gastar horas de um debate nacional com coisas que eu não tenho a menor ideia? E são bobagens. Na minha campanha não teve nada desviado. Nunca ouvi falar, perguntei pra todo mundo, e daí? Você entende? São coisas dessa natureza.

Na verdade, a única resposta do candidato Serra naquela segunda-feira (11) em Goiânia foi a que, com pequenas variações, foi publicada, da forma que se segue, pelos mais variados meios de comunicação.

Ainda mais: o Terra ouviu nesta segunda-feira (17) jornalistas que acompanhavam Serra na capital de Goiás. Unanimidade no desconhecimento de qualquer outra manifestação do candidato sobre Paulo Vieira de Souza, ou Paulo Preto, como também se verá nas linhas que se seguem.

Christiane Samarco é repórter do jornal O Estado de S.Paulo. Em sua reportagem de enviada especial a Goiânia, Samarco relatou: "Serra não quis comentar por que não respondeu a Dilma quando ela sugeriu que ele "deveria se lembrar de Paulo Vieira de Souza, seu assessor, que fugiu com R$ 4 milhões". Foi uma referência ao ex-diretor da Dersa paulista, citado na operação Castelo de Areia e que teria captado doações de recursos que não teriam sido repassados à campanha tucana. "Nunca ouvi falar disso e não sei do que se trata. Eles (os petistas) põem factoides para que a imprensa pergunte. Por que vou gastar horas de um debate nacional com coisas que eu não tenho ideia?", indagou. "Sou candidato. Você acha que eu não saberia se tivesse havido isso?"

Ao Terra, Christiane Samarco garantiu nesta segunda (18):

- O candidato Serra não disse nada além disso a respeito do Paulo Preto ou Paulo Viera. Não, não teve nada, isso foi no aeroporto e em seguida ele foi indo para o embarque.

Núbia Lobo é repórter do jornal O Popular, de Goiânia. Sua matéria não abordou o tema em momento algum, mas também ela, ouvida pelo Terra, declarou:

- Ele (Serra) não queria falar sobre o assunto (Paulo Preto), tanto na coletiva na rua quanto no aeroporto. Ele se esquivou, e só falou quando foi pressionado. Ele disse bem claro: "Quem é Paulo Preto?". Fora isto, acompanhando ele até a porta do avião, Serra apenas repetiu que não o conhecia.

Venceslau Pimentel é repórter do jornal O Hoje, de Goiânia. Sua reportagem também não mencionou o tema Paulo Preto. Ao Terra,, depõe Venceslau, 49 anos, 24 de jornalismo:

- O assunto Paulo Preto, ou Paulo Vieira, só surgiu em dois momentos. Ao final da caminhada, numa entrevista em meio a um tumulto, quando uma repórter gritou a pergunta "e o que o senhor sabe sobre o Paulo Preto?" e, acho, pode ser que ele não tenha ouvido. E depois, já no aeroporto, quando ele disse aquela frase que todos já publicaram.

No portal iG, sobre o mesmo assunto Adriano Ceolin publicou na segunda (11): "Isso é pauta petista. Não sei quem é o tal preto. Nunca ouvi falar disso. Eles (o PT) põem factoides para vocês virem perguntar", disse Serra. "Eu não entendi o que ela (Dilma) estava dizendo. Não ficar aqui gastando horas de um debate nacional com coisas que não tenho a menor ideia".

No dia seguinte, terça-feira (12), em viagem à Aparecida do Norte, questionado por jornalistas o candidato Serra falaria novamente sobre o caso Paulo Preto.

A Folha de S. Paulo publicou, nesse dia, reportagem de Andréa Michael sobre o assunto. A Folha.com expôs a íntegra da entrevista feita pela jornalista com ex-diretor de Engenharia da Dersa, Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto.

Nos trechos mais incisivos, o executivo que coordenou as obras no Rodoanel e Marginal Pinheiros no governo Serra revelou que Serra o conhecia e que com o governador havia conversado "umas dez vezes". E desabafou:

- Não se larga um líder ferido na estrada a troco de nada. Não cometam esse erro.

O Terra, neste dia, publicou reportagem, como outros veículos. Descreve a matéria do Terra: "Na visita à basílica de Nossa Senhora da Aparecida, Serra alegou que Paulo nunca trabalhou na arrecadação de verba para financiamento de campanha e buscou desmentir matéria da revista Istoé. Segundo a revista, o engenheiro teria procurado empresários e pedido colaboração para a campanha antes de sumir com o dinheiro".

Na entrevista em Aparecida, o tucano garantiu que "em absoluto, não houve nada parecido". Também afirmou que a acusação contra o ex-diretor era "injusta" e assegurou não ter havido nenhum desvio por parte de ninguém em sua campanha. "Isso tinha sido uma bobagem que saiu numa reportagem de uma revista, inclusive, tratando Paulo Souza de maneira preconceituosa, com um apelido preconceituoso". Fez, por fim, a defesa de Paulo Viera, o Paulo Preto: "Só sabia que o engenheiro era muito competente e que nunca ouviu nenhuma acusação contra ele".

Com variações de fraseado e detalhe, os demais meios publicaram as mesmas informações sobre a entrevista em Aparecida, ainda que Serra tenha dito que se referiu, no debate, à conversa com jornalistas em Goiânia, na véspera.

O Terra Eleições, que faz a mais ampla cobertura da campanha em todo o País, já publicou 7049 notícias e 486 galerias sobre as disputas em 27 estados e pela presidência da República. Os repórteres Claudio Leal e Marcela Rocha acompanham, Brasil afora, os candidatos Dilma Rousseff e José Serra, assim como foram e são acompanhados Marina Silva e Plinio de Arruda Sampaio. Quando os repórteres "carrapatos" não estão, colaboradores do Terra em cada Estado seguem os candidatos.

Tudo de relevante que dizem os candidatos a presidente é publicado em tempo real. Talvez, quem sabe, a questão não esteja no que o Terra não publicou e, sim, no que tem publicado como exige o jornalismo plural.


Originalmente publicado em 18/10, no Portal Terra

A natureza perversa da estratégia de Serra

O jornalista Ricardo Kotscho, em seu Balaio do Kotscho, reproduz uma análise que joga luzes sobre a natureza da estratégia eleitoral de Serra (PSDB). Um jornalista que ele não identifica lhe enviou o seguinte post:

"Lembra quando a gente falava sobre a campanha da Dilma um ano atrás? O que dizíamos?

1) Vai ser uma eleição dura, muito provavelmente decidida no segundo turno.
2) As condições objetivas favorecem amplamente o governo: a economia, a ascensão social de milhões, a liderança do presidente Lula.
3) As condições subjetivas também: recuperação da auto-estima, as perspectivas de futuro, o respeito externo conquistado pelo Brasil e por Lula.
4) Diante disso, restará ao adversário tentar desconstruir e desqualificar a candidata. É a única chance que eles têm.
5) Sendo José Serra este adversário, todos os recursos escusos serão mobilizados, no mundo e no submundo da informação.
6) Será, por isso mesmo, uma eleição suja, muito suja, talvez mais suja que o segundo turno de 1989.

Lembrou direitinho?

É exatamente o que está ocorrendo desde as últimas semanas do primeiro turno, com mais ênfase no início do segundo. O crescimento da Dilma entre dezembro e agosto, período em que ela passou de menos de 20% para cerca de 50% das intenções de voto, não foi uma onda.

Foi uma construção sustentada na progressiva identificação do nome de Dilma ao papel que ela desempenhou no governo Lula, aprovado por 80% dos brasileiros.

Para isso contribuíram a agenda social e regional da candidata, centenas de entrevistas a emissoras de rádio, tevês e jornais locais, os programas nacionais e regionais do PT, os momentos de visibilidade em torno do encontro e da convenção do PT, a agenda de debates e entrevistas em rede nacional, a costura das alianças políticas, a propaganda na televisão e no rádio, a partir de agosto, e o apoio entusiástico, generoso e qualificado do presidente Lula, o maior e melhor cabo eleitoral que um brasileiro poderia ter.

Esta construção foi o alvo de uma das mais sórdidas campanhas de desqualificação que eu vi nos meus 30 e poucos anos de jornalismo. Orquestrada e dirigida cientificamente por pessoas profundamente vocacionadas para esse tipo de objetivo.

Você acompanhou o Lula nos anos mais difíceis e sabe melhor do que eu do que estamos falando.

Mesmo assim, ela chegou ao primeiro turno com 47% das intenções de voto. Quando a eleição finalmente se transformou no que sempre imaginamos (mas ainda não tínhamos vivido, por causa da ilusão de vitória no primeiro turno), foi a Dilma, elazinha, quem botou ordem na confusão.

Foi a participação corajosa da minha candidata no debate da Band que surpreendeu o adversário, reposicionou o debate nos limites da política e alertou o país para a gravidade da decisão que vamos tomar em 31 de outubro. Vou resumir o que ela fez em quatro pontos:

1) Denunciou a campanha de ódio e as mentiras sórdidas que José Serra difunde, manipulando o preconceito e a religiosidade de setores da população;

2) Denunciou o plano dos tucanos de entregar o pré-sal às petroleiras estrangeiras, pelas mão de José Serra, o chefe das privatizações de FHC (você se lembrava que o Zé Leilão foi o presidente do Conselho Nacional de Desestatização?Pois ela nunca esqueceu).

3) Denunciou a hipocrisia de um candidato que promete e não cumpre, o que põe em risco a continuidade dos programas sociais do governo Lula.

4) De quebra, espetou na biografia do “homem sem escândalos” o caso Paulo Preto — e só assim a mídia amestrada passou a tratar do assunto.

O nome disso é liderança. Dilma ditou a estratégia que, na velocidade possível, vai orientando a campanha, animando a militância e engajando os muitos setores sociais que identificaram o risco que José Serra e sua campanha de ódio e divisão representam para o país e para a democracia.

Passadas duas semanas, Serra não conseguiu virar a eleição. A candidatura da Dilma não desmanchou na praia, como acontece com as ondas em São Sebastião.

A eleição está mesmo dura, camarada, como nós esperávamos. A Dilma está fazendo a parte dela. Cada vez mais gente está fazendo sua parte."


Do Balaio do Kotscho

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

O tucano da mala-preta

Paulo Preto (jornal na mão) ao lado de Serra, no Rodoanel


SERRA RENEGA PAULO PRETO 3 VEZES EM GOIANIA;

O ‘MALA-PRETA’ FAZ AMEAÇA A SERRA EM SP;

SERRA AJOELHA E REZA EM APARECIDA DO NORTE.


ACOMPANHE:


“Não sei quem é Paulo Preto.

Nunca ouvi falar.

É um factóide.”

(Serra, em Goiania; Terra; 11-10)


“Ele (Serra) me conhece muito bem… Todas as minhas atitudes foram informadas a Serra….Não se larga um líder ferido na estrada.Não cometam esse erro…”

(Paulo Preto, em ameaça velada a Serra, na Folha; 12-10)


“Ele não fez nada disso (NÃO SUMIU COM R$ 4 MILHÕES DO CAIXA 2 DA CAMPANHA)…Ele é totalmente inocente. Eu não pude responder no dia (do debate na Bandeirantes), porque ela (Dilma) aproveitou o final de uma fala e depois entrou outro assunto…”

(Serra, em Aparecida, onde comungou; Globo, 12-10)


Tópicos da vida de Paulo Preto (Paulo Vieira de Souza):


a) Diretor de Engenharia do Dersa, comandou as grandes obras da gestão Serra, como o Rodoanel, orçado em mais de R$ 5 bilhões, e a ampliação da marginal Tietê, orçada em R$ 1,5 bilhão; cabia a Paulo Preto fazer o pagamento às empreiteiras, bem como coordenar as medições das obras;

b) foi assessor da Presidência no governo de FHC e um dos responsáveis pelo programa ‘Brasil Empreendedor’;

c) mantem fortes laços políticos e pessoais com Aloysio Nunes, homem de confiança de Serra;

d) emprestou R$ 300 mil a Aloysio Nunes em 2007 para completar a aquisição de um apartamento em Higienópolis;

e) sua filha, Priscila de Souza, é advogada de escritório que defende empreiteiras contratadas pelo governo Serra para a construção do Rodoanel…

f) em junho de 2010, Paulo Preto foi preso na loja Guci, em SP, por receptação de bracelete de brilhante roubado da própria loja;

g) na atual campanha presidencial, Paulo Preto arrecadou e sumiu com R$ 4 milhões do caixa dois de Serra, segundo a revista “IstoÉ”. Passo seguinte, foi demitido do Dersa;

h) está sendo investigado pela Polícia Federal por suspeita de propina recebida da Camargo Correa (três parcelas de R$ 416 mil).


(Carta Maior, com informações Terra; Folha; IstoÉ;Globo; 13-10)

DEM, um candidato a sumir do mapa

Maria Inês Nassif | Valor Online

O DEM caminha para um processo de incorporação ou fusão com um partido maior - o PSDB ou o PMDB - independente do resultado das eleições presidenciais. Com uma bancada de 43 deputados e 6 senadores, o partido perdeu influência política, fundo partidário e horário eleitoral gratuito. Na avaliação de um de seus líderes, a fusão (ou incorporação) com outra legenda será inexorável - o DEM mantém-se nessas eleições com uma bancada semelhante a de partidos médios, mas ao contrário deles tende ao declínio. O PSB, por exemplo, tem mantido um crescimento contínuo. A soma de dificuldades regionais definirá para onde o partido vai - e, ao que parece, é menos difícil a composição com o PMDB.

O prefeito Gilberto Kassab (DEM) sai dessas eleições com uma força inédita em São Paulo. Conseguiu eleger 6 deputados federais e 8 estaduais. O PMDB elegeu no Estado apenas um federal e 5 estaduais. Se o desempenho do DEM paulista, que nunca antes da aliança Serra-Kassab havia prosperado no Estado, tivesse se repetido nos outros, o partido estaria mais do que salvo. Não foi o caso. Os redutos do ex-PFL nos Estados mais pobres, depois de uma terceira eleição na oposição ao governo federal, caíram como castelos de cartas, com a exceção do Rio Grande do Norte, onde o partido conseguiu eleger um senador, José Agripino, e uma governadora, Rosalba Ciarlini.

O enxugamento do partido a nível nacional, todavia, inviabiliza o crescimento do DEM em São Paulo a médio prazo. Daqui a dois anos, quando houver eleição para prefeito, o partido não deverá repetir a façanha de eleger mais um - será uma legenda nacionalmente pequena para se impor ao PSDB numa coligação e, se sair sozinho, não terá tempo suficiente de campanha de televisão suficiente para convencer o eleitor a votar nele. Seriam dois partidos - o PSDB e o DEM - disputando o mesmo eleitor, já que nos dois anos de governo Lula, e especialmente em São Paulo, passaram a falar para os mesmos setores sociais, de perfil conservador.

Para Kassab, o mais confortável seria a incorporação ou fusão ao PSDB em São Paulo. Manteria os mesmos aliados regionais de sempre e, na hipótese de Serra vencer o segundo turno, teria um forte aliado para não ser esmagado pelos tucanos paulistas dentro do partido; se Dilma vencer as eleições, ainda assim preferiria continuar com Serra. Mas não é o caso das outras sessões do partido.

Incorporação ou fusão entrarão na agenda depois do dia 31

A fusão ou incorporação do DEM, com o PMDB ou o PSDB, é uma forma de driblar a legislação que, nos últimos anos, tem reduzido a mobilidade dos políticos, por força de regras claras e duras contra a infidelidade partidária. A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de que o mandato é do partido, não do candidato, foi a última porta fechada para os tradicionais rearranjos partidários pós-eleitorais. Até então, os partidos e parlamentares que atuam na política tradicional, e que precisam de apoio da máquina federal para manter seu eleitorado, tendiam a deixar os partidos pelos quais eram eleitos e engordar a base governista, aderindo a uma legenda da base de apoio e de preferência forte no Congresso. Era o número da bancada no momento da eleição que definia o tamanho do horário eleitoral de televisão.

Hoje, o eleito que mudar de partido pode perder o mandato. A conta do tempo de rádio e televisão e do fundo partidário é feita de acordo com o número de eleitos. Não muda, mesmo que os parlamentares mudem de partido e arrisquem a perder os seus mandatos.

As exceções são a fusão e a incorporação. A diferença entre uma e outra é que, na fusão, dois partidos se juntam e formam uma nova legenda. Na incorporação, um partido é incorporado por uma legenda que já existe. Nos dois casos, as convenções dos dois partidos devem aprovar, por maioria, a incorporação ou fusão - e nas duas hipóteses o fundo partidário e o horário eleitoral serão a soma dos dois partidos que se unificaram. Os que discordarem da decisão da maioria poderão ir para outra legenda sem perder o mandato, mas não contarão para efeito de cálculo de fundo partidário e tempo de televisão dos partidos aos quais aderirem.

Essa não deverá ser a única mudança partidária a ocorrer depois das eleições, seja qual for o candidato vitorioso. Se for Serra, aliás, o interesse de dar mobilidade aos eleitos será muito maior, já que o Congresso eleito em 3 de outubro dá ampla maioria para os partidos aliados a Dilma Rousseff.

A outra opção que os parlamentares têm para se livrar da cassação, se decidirem abandonar os partidos pelos quais foram eleitos, é a criação de uma nova legenda. Nesse caso, contudo, esta nova legenda não terá direito a fundo partidário e tempo de televisão. O tempo de televisão e o fundo relativo a cada parlamentar que ingressar no novo partido continua sendo do partido que o elegeu. Neste caso, o novo partido terá que se submeter a uma votação para a Câmara dos Deputados para entrar na divisão do dinheiro do fundo e do tempo de TV.

No caso de incorporação ao PMDB, que tem uma digestão mais fácil pela maioria do partido, o DEM não se fundiria, ou se incorporaria, com a esperança de mudar a posição política do partido que está aliado a Dilma Rousseff. Essa opção está sendo discutida com a perspectiva de que o PMDB será um partido governista, quer ganhe Dilma, quer ganhe Serra.

Maria Inês Nassif é repórter especial de Política. Escreve às quintas-feiras

E-mail maria.inesnassif@valor.com.br

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Comento brevemente:

Escrevi isso em minha coluna de jornal no dia 14/set:

O presidente Lula certamente ainda tem, atravessada na garganta, a bravata do então senador Jorge Bornhausen(PFL->DEM), que proferiu a eugênica ameaça de que iria "acabar com a raça dos petistas" por pelo menos 30 anos. Mas penso que nem isso justifica a tardia reação, feita em comício na segunda-feira, em Joinville, quando Lula disse que o DEM deveria ser "extirpado" da política brasileira. Primeiro, porque sua figura de estadista, em pleno mandato, não o permite. Segundo, porque nem é necessário, ante a natural extinção do partido. Já no próximo mandato, a tropa demista no Congresso e nos palácios estaduais deve ser reduzida à insignificância política.

E fui criticado, em uma rádio local, por estar "falando bobagem". Será bobagem também o que diz agora a Maria Inês Nassif?